Autor: Paulo Moura (Dunga) *
No tempo do meu avô
Dizia-se com clareza
Que um fio de bigode
Representava nobreza
Ou então a afirmação
De que: - Vou cuspir no chão!
Era sinal de firmeza.
Que beleza não põe mesa
Todos já devem saber
E de que julgar alguém
Sem sequer lhe conhecer
É uma idéia falha
Porque, às vezes, gentalha,
É quem está no poder.
Certo dia ouvi dizer
Que o JUIZ de uma cidade
Do auge da competência
De sua autoridade
Se recusou receber
Um homem, por ofender
A sua dignidade
A “ofensa” ou maldade
Que esse homem do mato
Cometeu com o JUIZ
Não foi algo insensato
O POBRE foi recusado
Na sala do magistrado
Porque tava sem sapato
O JUIZ, de fino trato
Não gostava de gentalha
Reclamou ao tabaréu
Porque estava de sandália
E que naquela audiência
Na frente da excelência
Era uma terrível falha
Sem ter alguém que lhe valha
O POBRE homem inato
Chorando disse ao JUIZ
Doutor, não sou insensato,
Sou honesto, embora pobre
Sou desprovido de cobre
Para comprar um sapato
Diante daquele ato
A imprensa acudiu
Saiu no noticiário
Todo o mundo assistiu
“Trabalhador recusado
Porque estava calçado
De forma indigna e viu”
Como ninguém lhe aplaudiu
O JUIZ foi consultado
Pediu desculpas ao povo
Achou ter “exagerado”
Não sabia que o pobre
Não tinha lá muito cobre
E deu o caso encerrado.
Novo dia foi marcado
Para a nova audiência
A imprensa foi atrás
Pra ver Vossa INCELÊNCIA
Destrinchar o veredicto
Pois era homem contrito
De muita classe e decência
Só não tinha consciência
De estar tão equivocado
Porque a honra de um homem
Não esta no seu calçado.
Vestido com mais “decência”
O POBRE foi pra audiência
Com um sapato emprestado
E estava bem apertado
Pois de número menor
O seu sogro lhe emprestou
Porque dele teve dór
Visando grande sacada
O juiz da palhaçada
Fez algo ainda pior
Pensando ser o maior
O JUIZ rico e astuto
Na frente dos jornalistas
Presenteou o matuto:
Bem limpinho e engraxado
Um par de sapato usado
Mas que não era fajuto!
“De aceitar eu reluto!”
Lhe exclamou o rapaz
Um presente do senhor
Eu não vou querer jamais...
Na terra em que fui criado
Os que mais andam calçados
É que são os marginais...
* = Paulo Moura (Dunga), poeta-cordelista membro da UNICORDEL-União dos Cordelistas de PE, pesquisador do Cangaço e Sócio da SBEC (Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço).Tem diversos Cordeis publicados, quase todos fazendo referencia ao Cangaço. Profere palestras sobre Lampião e o Cangaço e sobre a Literatura de Cordel.
Contatos: 81 9421 2653 ou paulodunga@bol.com.br