26 de abril de 2008

Interior de hoje em dia ou A Peleja do Créu com o Forró!

"Isso é cagado e cuspido/paisagem do interior" - Jessier Quirino

(Para Alberto Oliveira, Anselmo Alves, Saulo Gomes e Xico Bezerra)

No lugar onde eu resido
Cadeado inda é tramela
Não é tão evoluído
Mas já se assiste novela
E também telejornal
Por lá se toma nescau
Mas bom é leite de vaca
Lá se come sanduíche
E se diz oxente e vixe
E se enfia o pé na jaca.

Zona é coisa do passado
Não se vê mais cabarés
O serviço hoje é prestado
Lá nos quartos dos motéis
Que ficam na rodovia
Se prestam para a orgia
E pro namoro em segredo
Quem não tem o "faz-me-rir"
Só resta se divertir
No matagal e lajedo.

Moleque lá faz mandado
Temendo o cuspe no chão
Mas celular é usado
E de última geração
Muitos costumes mudaram
Pra melhor ou pioraram
Mãe solteira hoje é normal
E ninguém se escandaliza
Com o que o povo realiza
No plano sexual.

E por lá tem parabólica
Que leva o mundo até nós
E tem a turma católica
Tal qual a nossos avós
Devota de Padim Ciço
Quem não gosta muito disso
É a Igreja Glacial
Que não engole romeiro
Mistura fé com dinheiro
E Jesus com capital.

Ouve-se a trova brejeira
Do mestre Chico Pedrosa
Mas se dança a noite inteira
Com a Gatinha Manhosa
Mastigo cravo e chiclete
E essa tal de internet
Pra mim não é novidade
Que espanto não lhe cause
Mas sempre vou na lanrause
Quando visito a cidade.

No natal o mercantil
Sufocou a cristandade
Mas inda há pastoril
Em uma ou outra cidade
Da mesma forma o reisado
Ou algum presépio armado
Lembrando que o Menino
É o motivo da festa
Isso é coisa que ainda resta
No natal do nordestino.

Crianças vão à escola
Menos no tempo de inverno
Pois até trator se atola
E pra passar é um inferno
Já para a agricultura
É uma beleza pura
De verde o campo se cobre
Plantio de rico se irriga
Mas a seca inda castiga
A roça do homem pobre.

Inda se tange boiada
Em um cavalo montado
Porém a moto é usada
Também pra cuidar do gado
Pro trampo botina calço
Pro lazer um "naique"
falso
Nos meus pés eu logo enfio
Se agarro uma gatinha
Já uso até camisinha
Pois na sorte eu não confio.

Vaqueiro veste gibão
Com roupa que vem da China
Padeiro fabrica o pão
Com trigo da Argentina
Interior não se isola
Escuta o som da viola
E o verso do cordelista
O forró de pé-de-bode
Mas também axé, pagode
E até fanque entra na lista.

Tem muita festa animada
Pelos herdeiros do Rei
Porém parte da moçada
Só quer o som
do djidjei (DJ)
Lampião inda é herói
Pois foi o nosso caubói
Embora rei dos bandidos
Hoje herói tem de montão
Nesses filmes do Japão
Ou dos Estados Unidos.

O tigrão e a lacraia
Do jeito que vêm se vão
Mas duvido alguém dar vaia
Pras músicas de Gonzagão
Pode até não se gostar
Mas se sabe respeitar
Reconhecer o valor
Que venham Jamil, Chiclete
A Cláudia Leite, a Ivete
Venha lá seja quem for.

Até Mulher Melancia
Vindo virada no créu
Mostrando a lapa da jia
Não derruba Maciel
Nem Petrúcio, nem Santana
E pá de gente bacana
Do forró de pé-de-serra
Que vá praquele lugar
A calcinha, o caviar
Que a gente vence essa guerra.

Recife, Abril/2008

23 de abril de 2008

19 de abril de 2008

7º Festival Nordestino de Poetas Populares

















Estátua do poeta Cego Aderaldo (Quixadá-CE) Foto: Zoraia Nunes

Após assistir na noite deste sábado, 19/04, dia do índio e do aniversário do poeta Manoel Bandeira, a apresentação dos participantes do 7º Fenopop - Festival Nordestino de Poetas Populares, no majestoso Teatro Santa Isabel, onde me embriaguei com generosas doses de poesia servidas por Zé Laurentino, Raudênio Lima, Diomedes Marianho, Marinho, Chico Pedrosa e a danadinha da Vassula, além do porre de improviso provocado pelo abstêmio Ivanildo Vilanova e pelo magistral Sebastião Dias, só consegui dormir depois que joguei pra fora os versos abaixo, que estavam avulsamente martelando no meu juízo e que talvez me dessem insônia ou ressaca se não fossem regurgitados.

La vão eles:

O mundo se empalidece
Com tanta notícia ruim
Tanta desgraça acontece
Porque a vida é assim?

Por mais que se faça prece
Pra Javé ou Elohim
A todo instante aparece
Novo herdeiro de Caim.

Chafurdando, a humanidade,
Na lama da iniqüidade
Se perde no desamor

Quando mais o tempo avança
Mais se vai a esperança
Que tenha fim toda dor.

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Ser poeta... é ir bem mais além
Do domínio da métrica e da rima
Exprimir-se de um jeito que ninguém
Além desse poeta assim se exprima.

Enxergar de um modo nunca visto
Descrever de uma forma especial
Surpreendendo assim com o imprevisto
Sobre algo já batido e até banal.

É contar a mesma história milenar
Porém por um ângulo peculiar
Que nos faça dizer: - Eita poeta!

Eu não sei se um dia assim farei
Mas eu tento, eu tento e tentarei
Pois chegar perto disso é minha meta.