26 de maio de 2007

A BRIGA DO GALO COM O PEIXE (*)
PRA TER DIREITO À CONCÓRDIA
Autor: José Honório da Silva

Que nosso Galo é de briga

O seu hino já falou
É por isso que Enéas
Mais uma vez provocou
E o Peixe que não é mole
Não bateu fofo, peitou.

O espaço da folia
Está sendo disputado
Pelos patrocinadores
Que investiram um bocado
No Carnaval como um todo
E neste bloco afamado.

A disputa entre as cervejas
Há muito vem acirrada
Se Nova ou desce redondo
Pouco importa, camarada!
Porque o povo bem sabe:
A boa mesmo é gelada.

Quer no rádio ou na tv
Nos horários de audiência
A propaganda é constante
Detonando a concorrência
Cada qual tenta mostrar
Que detém a preferência.

Mas briguem por lá que eu
Partido não vou tomar
Tendo “ceva” eu tomo todas
Isto jamais vou negar
Mas não tendo basta frevo
Para eu desembestar.

Além disso em briga alheia
Não sou de meter o dedo
Eu só sei que Deus querendo
Eu estarei logo cedo
Fazendo o passo no Galo
Sem ter um tico de medo.

No Galo se vê de tudo
Em termos de carnaval
Tem o frevo que domina
Sendo o prato principal
Nesse banquete de ritmos
Que levantam nosso astral.

Tem abre-alas, baianas
Toureiros e mandarins
Passistas, porta-estandartes
Tocadores de clarins
Tem colombinas faceiras
Pierrôs e arlequins.

Palhaços, xeiques, piratas
Odaliscas, enfermeiras
Bailarinas, normalistas
Diabos, padres e freiras
Onças, anjos, gatas, noivas
Tiazinhas, feiticeiras.

Tem folião casual
Que não vai fantasiado
Usa bermuda e camisa
Um sapato já sambado
Se embala com o frevo
E faz o passo rasgado.

Gente que vai pelo frevo
Pelo embalo da folia
Gente a fim de se dar bem
No xumbrego da orgia
Seja qual for o motivo
No Galo se extasia.

Aos que lhes falta coragem
De juntar-se à multidão
Por medo, por preconceito
Por qualquer limitação
Há camarotes pra quem
Puder gastar seu carvão.

Mas o bom é ir pro meio
Do povo que se atropela
Quando do trio se ouve
“Você diz que ela é bela...”
A pernambucanidade
É aí que se revela.

Tem casado que dá drible
Na mulher e vai sozinho
Diz que vai fazer um bico
Combina com seu vizinho
Passa o dia na muvuca
Chega em casa bem quietinho.

Tem também mulher que vai
Escondida do marido
Veste um short, calça o tênis
E diz pra ele: - Querido
Eu vou lá na costureira
Para provar um vestido.

Tem gente cheirando lança
Pra ficar numa maior
Cheira loló, cheira cola
Eu não sei o que é pior
Prefiro cheirar cangotes
Molhadinhos de suor.

Lá no Galo todos brincam
Numa só cumplicidade
Criança, jovem, coroa
Folião de toda idade
Acompanhado ou sozinho
Quer seja ou não da cidade.

Muitos dos que lá não vão
Gostariam de poder
Mas o que pode e não vai
Eu não consigo entender
Só lamento que não saiba
O que está a perder.

Infelizmente também
Tem os pais desnaturados
Que levam os filhos e não
Têm os devidos cuidados
Não os protegem do sol
E nem dão água aos coitados.

No Galo também tem gente
Que não vai pra brincadeira
São lanceiros bem atentos
Aos que estão de bobeira
E depois que dão o lance
Lá se foi sua carteira.

Tem quem vai com o propósito
De provocar confusão
Passa a mão na bunda alheia
Dá pisada e beliscão
Cantando mulher dos outros
Dando soco e empurrão.

Fazem para aparecer
Para mostrar valentia
Pensando ganhar cartaz
Perante alguma guria
Porém nem mesmo conseguem
Estragar nossa alegria.

Mulheres que se aproveitam
E dão corda aos donjuans
Comem, bebem às suas custas
Olhando pra suas cãs
E na “hora da verdade”
Desaparecem nas vans.

Tem cara que força a barra
E às minas dão bebidas
No intuito de deixá-las
Fogosas, desinibidas
E assim tê-las nas malhas
De suas mãos pervertidas.

Tem travesti exibindo
A forma siliconada
Sobre dois palmos de salto
Levando vaia e dedada
Dos gaiatos de plantão
Que não deixam passar nada.

Tem sapatões que se vestem
De soldado ou de palhaço
Com cachaça na cachola
Entram logo no amasso
E sem ligar para o povo
Tome beijo e tome abraço.

Tem o que vende comida
Daquelas comeu-morreu
Ganhar o mais que puder
É este o desejo seu
Mesmo que fique doente
Quem seu quitute comeu.

No começo é maravilha
Mas depois de certa hora
A cerveja só vem quente
O calorão estupora
As brigas se intensificam
O melhor é ir embora.

Digo que as almas sebosas
Jamais serão empecilho
Para que o Galo sempre
Mantenha firme este brilho
E um pai possa brincar
Trazendo no braço o filho.

No bairro de São José
O Galo tem endereço
Muitos lá se equilibram
Outros viram pelo avesso
Se para uns basta o Galo
Pra muita gente é o começo.

Nos versos quase finais
Eu grito: “Ei Pessoal!...”
O Galo da Madrugada
É mesmo “felomenal
Mas o Carnaval da gente
Faz-se multicultural.

A nossa festa maior
É cultura que lateja
A alma pernambucana
Pelas ruas se despeja
Levando alegria ao povo
Onde quer que ele esteja.

FIM Fevereiro/2005

(*) - O "peixe" do título é o secretário de
Cultura do Recife, João Roberto Peixe, com
quem a direção do Galo da Madrugada
travou um embate por conta das cervejarias
patrocinadoras.

4 comentários:

Jéfte Sinistro disse...

Muito Bom o verso!! Mais uma vez nosso amigo Honório... arrebentando na poesia popular!

tranquelino disse...

Oi Honório,

Realmente sua poesia retratou o Galo da Madrugada com uma perfeição de quem conhece e participa dela.

Gostaria de ler uma poesia de sua autoria falando do Grupo: Matutos de Timbaúba dos Mocós.

Forte abraço do Matuto Tranquelino

Thiago Paulino disse...

Boa Poeta!

Me senti frevando em plena concórdia.. muito boa a parte do marido que dá o drible na esposa, e da mulher q vai na costureira (hehehehhe) você pegou muito bem o espírito da folia ressaltando inclusive os seus aspectos infelizes..

Mas só uma dúvida cadê o peixe nesta história? (talvez outro título ficasse melhor..)

Adorei os versos também que descrevem quando o povo entoa os cânticos de Oh bela de Capiba. Rapaz isso tudo q vc descreve é a cara do carnaval Pernambucano! E ói q vc nem falou do Caranval de Olinda e do Homem da Meia Noite.. imagine se falasse..

Parabéns!
Abraço forte.
Thiago Paulino

Luiz Alberto Machado disse...

Bom demais, Honoriamigo, bão demais mesmo. Está cada vez melhor.
Abração
www.luizalbertomachado.com